Julizar Dantas
A abordagem no controle do estresse deve abranger os níveis organizacional e individual. Ambos são muito importantes e têm efeitos complementares.
Devemos utilizar os modelos teóricos para estabelecer as intervenções organizacionais e a promoção da saúde nos ambientes de trabalho. Os dois modelos discutidos neste livro apresentam certo grau de superposição.
O componente “Esforço” (demandas extrínsecas) do “Esforço-Recompensa” é similar às “demandas físicas e psicológicas” do “Demanda-Controle-Suporte social”. Portanto, haverá superposição das recomendações de medidas preventivas referentes ao gerenciamento de demandas.
Devemos utilizar os modelos teóricos para estabelecer as intervenções organizacionais e a promoção da saúde nos ambientes de trabalho. Os dois modelos discutidos neste livro apresentam certo grau de superposição. O componente “Esforço” (demandas extrínsecas) do “Esforço-Recompensa” é similar às “demandas físicas e psicológicas” do “Demanda-Controle-Suporte social”. Portanto, haverá superposição das recomendações de medidas preventivas referentes ao gerenciamento de demandas.
A estratégia de intervenção centrada na organização baseada no modelo Esforço-Recompensa é a restauração do equilíbrio entre as duas dimensões e deve ser aplicada de acordo com os seus componentes:
a) Esforço (extrínseco):
- mudanças na organização do trabalho (autogestão das equipes, descentralização das decisões), com distribuição equitativa da carga de trabalho e redução do excesso de horas-extras (especialmente as não-remuneradas);
- respeito ao repouso semanal e ao interstício mínimo entre as jornadas de trabalho, gozo integral das férias;
- opções de horário de trabalho flexível e previsibilidade das escalas de trabalho;
- melhoria da estabilidade e segurança no emprego.
b) Recompensa (extrínseco):
- premiação por trabalhos de destaque, facilidades para atividades recreativas (clubes e quadras esportivas, salas de relaxamento);
- desenvolvimento das habilidades de liderança, entre os gerentes e supervisores, para aplicar a assertividade, feedback e reconhecimento apropriados nas relações interpessoais, como instrumentos para a concepção de um ambiente de trabalho emocionalmente saudável;
- plano de carreira com oportunidades e critérios de promoção previsíveis e bem definidos. Treinamento para desenvolvimento profissional;
- desenvolvimento do suporte social no trabalho;
- sistemas de comunicação e informação eficazes e transparentes.1
A estratégia de intervenção centrada na organização baseada no modelo “Demanda-Controle-Suporte Social” deve abordar simultaneamente os três elementos principais que compõem o ambiente de trabalho: as demandas psicológicas, o controle sobre o próprio trabalho e o suporte social proveniente da gerência, da supervisão e dos colegas de trabalho.
- O gerenciamento das demandas psicológicas implica:2,3,4
- evitar o prolongamento da jornada de trabalho:
- dimensionar o efetivo de pessoal proporcionalmente às exigências operacionais;
- reduzir as horas extras;
- respeitar o interstício legal entre as jornadas de trabalho, propiciando o tempo para recuperação repouso, relaxamento e sono reparadores;
- controlar o trabalho de sobreaviso, por exemplo, criando escalas de plantão fora do expediente e nos fins-de-semana;
- respeitar horário de almoço e final do expediente;
- evitar a realização de tarefas domiciliares;
- controlar o acesso ao correio eletrônico fora do ambiente organizacional;
- substituir pessoas ausentes por motivo de férias, transferências ou doença;
- alocar pessoas experientes em postos estratégicos nas equipes;
- fortalecer o entrosamento entre os membros da equipe;
- capacitar as pessoas para trabalhos de alta complexidade;
- identificar e evitar o gerenciamento por pressão;
- atenuar as demandas conflitantes pelo diálogo e supervisão eficazes;
- negociar e redimensionar a exigência de tempo para execução das tarefas;
- considerar a variabilidade e complexidade do processo produtivo;
- estabelecer alternativas de gerenciamento do conflito entre a pressa e a perfeição na execução de tarefas;
- abolir premiação baseada em produtividade individual. O número de peças produzidas, itens processados ou de tele atendimentos realizados não devem ser utilizados como critério de avaliação e bonificação. O gerenciamento da produtividade deve seguir outros critérios técnicos;
- evitar o ritmo de trabalho excessivo:
- incluir e permitir pausas formais e informais;
- negociar prazos ou reforço no efetivo das equipes;
- melhorar as condições de trabalho (ferramentas e manutenção preventiva de equipamentos);
- capacitar as pessoas em técnicas de administração do tempo;
- adequar o ambiente aos trabalhos de alta densidade e às tarefas que exijam solicitação intelectual e atenção constantes (uso frequente da memória imediata e grande número de tomada de decisões):
o reduzindo a frequência de interrupções das tarefas; o controlando:
- o ruído aos níveis compatíveis com a execução das tarefas;
- a temperatura efetiva do ambiente entre 20 e 23 ºC;
- a velocidade do ar (não superior a 0,75 m/s);
- a umidade relativa ao ar não inferior a 40%;
o introduzindo pausas;
o fazendo rodízio nas tarefas de alta exigência; o propiciando folgas e férias regulamentares;
- adequar as normas de produção, evitando as demandas conflitantes entre o trabalho real e o trabalho prescrito;
- dar significado ao trabalho;
- reduzir a dependência de atividades realizadas por terceiros;
- criar grupo de trabalho para identificar tarefas desnecessárias: o que não precisamos fazer?
2. Aumentar o controle sobre o próprio trabalho significa:2,3,4
- desenvolver habilidades especiais e aprender coisas novas. Capacitar-se para novos desafios dentro da empresa. Investir no desenvolvimento de competências, isto é, adquirir conhecimento, habilidades e atitudes.
- Um exemplo é a capacitação de líderes para o gerenciamento de conflitos.
- incentivar a aplicação da criatividade, premiando as propostas de inovações, ideias e invenções relacionadas ao trabalho;
- modificar a organização do trabalho;
- descentralizar as decisões gerenciais;
- aumentar a autonomia das gerências e supervisão de equipes;
- incentivar a participação da equipe nas tomadas de decisão em reuniões setoriais;
- ampliar a capacidade decisória individual sobre o próprio trabalho;
- revisar os padrões de procedimentos operacionais, tornando-os mais flexíveis;
- permitir, incentivar e promover o rodízio de tarefas críticas;
- enriquecer e diversificar as tarefas monótonas e repetitivas;
- permitir a flexibilidade do horário de trabalho;
- Escalas de trabalho em turnos;
- dar estabilidade e previsibilidade na tabela do trabalho em turnos;
- estabelecer a rotação horária (manhã/tarde/noite) na tabela de trabalho em turnos;
- fazer o rodízio entre os horários entre dois e três dias;
- propiciar folgas nos fins-de-semana;
- introduzir o uso saudável da tecnologia;
- automatizar processos críticos;
- treinar e capacitar as pessoas antes da introdução de novas tecnologias;
- dimensionar as configurações do hardware e software de forma compatível com a exigência da tarefa;
- Incluir a participação da equipe na escolha dos novos equipamentos, instrumentos e mobiliário;
- incentivar a participação individual em comissões e grupos de trabalho
- O suporte social no trabalho.2,3
O suporte social em nível adequado atua como um fator protetor ao desgaste. Essa proteção depende do grau de integração social e confiança entre os colegas de trabalho, supervisores e gerentes, isto é, o suporte sócioemocional.
O suporte social no trabalho deve merecer um destaque nas políticas e diretrizes das empresas e nas intervenções de prevenção e controle do estresse. Há fortes evidências de que o baixo suporte social intensifica o risco associado ao trabalho de alto desgaste, ao passo que o suporte social elevado atua como um fator de amortecimento dos efeitos prejudiciais.5
Existem vários aspectos relacionados ao suporte social. Os mais relevantes são o apoio fornecido pelos supervisores e colegas de trabalho. Torna-se necessário investir em treinamento da liderança, a fim de desenvolver habilidades para o relacionamento com as equipes, especialmente em:
- feedback positivo que se manifesta no elogio sincero, merecido e proporcional ao trabalho bem feito e na crítica honesta e construtiva;
- técnicas de resolução de conflitos e relacionamento interpessoal;
- significado do trabalho. Morin (2002) afirma que um trabalho significativo apresenta as seguintes características:
- é eficiente e gera resultados;
- é intrinsecamente satisfatório;
- permite a aprendizagem e o desenvolvimento de competências;
- há correspondência entre as exigências do trabalho e as competências do trabalhador;
- incorpora a criatividade e autonomia;
- permite a utilização de margem de manobra na administração das atividades e resolução dos problemas;
- é moralmente aceitável;
- é fonte de experiências de relações humanas satisfatórias;
- promove a segurança e autonomia financeira;
- mantém as pessoas ocupadas.6
Almeida (2006) comenta que o trabalhador necessita de especial cuidado no que diz respeito ao conhecimento prévio dos objetivos organizacionais. Isso deve refletir positivamente sobre a realização pessoal e profissional.7
Outros aspectos importantes são:
- assertividade. Torna-se necessário estabelecer políticas organizacionais de real reconhecimento, valorização e respeito às pessoas. Reconhecer a autoria de contribuições efetivas. As relações assertivas no trabalho pressupõem uma atitude firme em defesa dos interesses e direitos básicos, sem negar os deveres e os direitos de terceiros. Devem pautar-se pela liberdade de expressão das ideias, sem constrangimentos. A forma deve ser adequada, imediata e oportuna, sem receios de desqualificações, repreensões ou retaliações. A assertividade deve propiciar a oportunidade para discussão. Propor a controvérsia de modo convincente, mas sem prejudicar a comunicação com os interlocutores, promovendo o diálogo.3
- prevenção da discriminação e do assédio moral. O assédio moral relacionado ao trabalho está ligado a qualquer conduta abusiva. Esta pode ser representada por comportamentos, palavras, atos, gestos ou escritas, em relação a uma pessoa. Em geral, é prolongada e repetitiva, resultando em dano à personalidade, à dignidade ou mesmo à integridade física ou psíquica da vítima. Pode resultar na degradação deliberada do ambiente de trabalho ou na perda de emprego. O assédio moral ocorre em ambientes caracterizados pelas relações hierárquicas assimétricas e desumanas, propícias ao abuso de poder. Manifesta-se pelas condutas e atitudes antiéticas numa relação hierárquica de subordinação ou excepcionalmente, entre colegas de trabalho. A valorização dos princípios morais deve ser formalizada em códigos de ética das empresas. A cultura da assertividade, as boas relações interpessoais e a abertura de canais de comunicação, entre eles a ouvidoria interna, são ferramentas úteis na prevenção do assédio moral e de todas as outras formas de discriminação.
Podemos acrescentar outros aspectos relacionados ao suporte social no trabalho, não previstos pelos modelos originais. O suporte instrumental merece destaque. Uma das principais fontes de ansiedade é a falta de recurso material. Sabemos o quanto é difícil executar uma tarefa sem as ferramentas adequadas. São aspectos positivos para a elevação do suporte social:
- o fornecimento do suporte material básico em qualidade e quantidade suficientes;
- a adequação das condições ergonômicas às características psíquicas e fisiológicas dos trabalhadores;
- os postos de trabalho com níveis de ruído adequados;
- o conforto térmico e a boa iluminação (sem reflexos ou ofuscamentos);
Sabemos que a carga de trabalho aumenta quando a flexibilidade da organização de trabalho e as alternativas operatórias frente à variabilidade das situações de trabalho diminuem. As estratégias de promoção da saúde mental visam à redução da carga de trabalho e do desgaste do trabalhador. Devem tornar a organização do trabalho mais flexível. Entre as ações propostas, destacamos:3
- permitir a ampliação das “margens de manobra” e levar em consideração os modos operatórios dos trabalhadores na implantação dos processos de padronização operacional;
- aumentar o controle que o trabalhador exerce sobre o próprio trabalho. Isto implica oferecer condições para que ele possa desenvolver habilidades especiais, aplicar a criatividade, aprender coisas novas, diversificar as tarefas, influenciar na equipe, ampliar a capacidade decisória e a autonomia para tomar decisões sobre o próprio trabalho;
- regular as demandas psicológicas relacionadas à execução das tarefas. O diálogo, a negociação com os supervisores e as relações assertivas são essenciais para o gerenciamento e adequação dos seguintes aspectos:
o o trabalho excessivo;
o as demandas conflitantes;
o o ritmo excessivo;
o a alta complexidade e variabilidade do trabalho;
o o tempo insuficiente para a execução das tarefas;
o o nível de concentração requerido;
o a frequência de interrupção das tarefas;
o a dependência de atividades realizadas por terceiros.
As condições ambientais adversas também contribuem para aumentar a carga de trabalho. Os riscos ambientais, de natureza física (calor, frio, vibrações, ruído, entre outros), química e biológica e as condições ergonômicas, podem atuar sinergicamente com uma organização do trabalho autoritária e inflexível, intensificando a carga física, psíquica e cognitiva, provocando o desgaste e o adoecimento.
Em síntese, é necessário que as empresas adotem processos de gestão capazes de conciliar a produtividade com a redução da insegurança no emprego. Ao mesmo tempo, devem estabelecer diretrizes para aumentar o suporte social proveniente da gerência, da supervisão e dos colegas, fornecer suporte instrumental eficaz, plano de carreira atraente e políticas de benefícios que atendam às necessidades do trabalhador e família.3
REFERÊNCIAS:
1. TSUTSUMI, A.; KAWAKAMI, N. A review of empirical studies on the model of effort–reward imbalance at work: reducing occupational stress by implementing a new theory. Social Science and Medicine, United Kingdom, v.11, n.59, p. 2335-2359, 2004.
2. LEVI, L. O guia da comissão européia sobre stress relacionado ao trabalho e iniciativas relacionadas: das palavras à ação. In: ROSSI, A.M.; PERREWÉ, P.L.; SAUTER, S.L. Stress e qualidade de vida no trabalho. São Paulo, Atlas, 2005. Cap.12, p.167-181.
3. DANTAS, J. Hipertensão arterial e fatores psicossociais no trabalho em uma refinaria de petróleo. 2003. 143 p. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) – Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública,Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003.
4. COUTO, H.A.; NICOLETTI, S.J.; LECH, O. Gerenciando a LER e os DORT nos tempos atuais. Belo Horizonte: Ergo, 2007.
5. SCHNALL, P.L.; LANDBERGIS, P.A.; BAKER, D. Job strain and cardiovascular disease. Annual Revue of Public Health, Palo Alto, v.15, p.381-411, 1994.
6. MORIN, E. Os sentidos do trabalho. São Paulo: ERA, 2002.
7. ALMEIDA, P.E. Os sentidos do trabalho e o aspecto comunicacional para empregados em regimes distintos de trabalho. 2006. Dissertação (Mestrado em Gestão e Desenvolvimento Regional), Universidade de Taubaté, São Paulo, 2006.