Julizar Dantas

                       

Se aglutino o átomo na bomba de nêutrons

apenas elitizo a guerra com ódio plutônico

exaurindo a vida na matéria intacta.

Sob a égide do ódio, a ira do átomo.

Explodem ecos de Hiroshima e Nagasaki agônicas

duelo suicida de história e tragédia atômicas.

 

            A análise da teoria do estresse é complexa, tendo em vista o seu próprio conceito. Existe farta produção científica sobre o assunto, abordando diferentes aspectos nos campos da medicina, psicologia e filosofia.1 A falta de consenso sobre o conceito de estresse tem causado muitas dificuldades na determinação do verdadeiro papel que ele exerce na epidemiologia das doenças cardiovasculares.

            De uma maneira genérica, entende-se que o estresse é um conjunto de reações do organismo, caracterizado pela perturbação do estado de equilíbrio interno (homeostase), gerada pela impossibilidade do indivíduo de se adaptar à exposição prolongada aos agentes estressores, isto é, às ameaças e agressões oriundas de estímulos ambientais inusitados ou hostis, de natureza física ou psíquica.

            O estresse é a própria Síndrome geral de adaptação descrita por Hans Selye como um conjunto de reações fisiológicas eminentemente somáticas, de cunho sobretudo emocional, que surge quando o organismo é compelido a adaptar-se a alguma situação alarmante.2 Pode ainda ser conceituado como uma relação de desequilíbrio entre o ambiente e o indivíduo, ressaltando-se, porém, que o cérebro necessita de graus específicos de estimulação ambiental para funcionar adequadamente.3

            Outro conceito muito difundido é que o estresse psicológico caracteriza-se por uma relação particular entre o indivíduo e o ambiente que é interpretado por ele como um processo de sobrecarga que ultrapassa as suas possibilidades de adaptação e que ameaça o seu bem-estar.4

            Selye (1956) introduziu o termo estresse, que designava todos os efeitos inespecíficos de fatores que podem agir sobre o organismo – os agentes estressores – capazes de produzir o estresse que foi caracterizado como uma síndrome de adaptação geral, composta de três fases:

a)    reação de Alarme: preparação para a luta ou fuga;

b)    fase de Resistência ou Adaptação, na qual o equilíbrio corporal, mais ou menos precário, é mantido pela hiperatividade simpática e do eixo hipotálamo/hipófise/suprarrenal.

c)    fase de Esgotamento ou Exaustão: a exposição persistente ao agente ou estímulo estressor provoca a falência dos mecanismos de adaptação e esgotamento das reservas de energia, baixa da imunidade e início do adoecimento.2

            Nesta formulação, encontra-se implícita a inespecificidade das demandas ambientais e a importância da intensidade e duração da pressão na relação com a resposta do organismo.5

            Os estressores

            Os estressores podem ser agrupados em três categorias principais:

a) estressores psicológicos, baseados em uma resposta de aprendizagem à ameaça de uma condição adversa (medo, ansiedade, exposição a contextos ou ambientes hostis)

b) estressores que consistem em estímulos físicos ou apresentam um poderoso componente psicológico (dor, imobilização);

c) estressores que alteram a homeostase cardiovascular (hemorragia, estresse postural, exercício, exposição a temperaturas extremas (calor, frio).6

            Em 1967, Holmes e Rahe introduziram a Escala de Avaliação de Reajustamento Social. Ela presume que os eventos de vida que provocam mudanças relativamente inesperadas no ambiente social do indivíduo (morte na família, divórcio, prisão, casamento, entre outros) geram desgaste e aumentam a probabilidade de adoecimento.7

            Os eventos de vida estressores podem ser classificados em:

  • dependentes: implicam a participação do sujeito. Dependem da forma como o sujeito se coloca nas relações interpessoais, como ele se relaciona com o meio, onde seu comportamento provoca situações desfavoráveis para si mesmo;
  • independentes: são aqueles que estão além do controle do sujeito, independem de sua participação, sendo inevitáveis. 8,9,10

            A resposta ao estresse

            A primeira etapa da resposta ao estresse é o reconhecimento do estímulo estressor mediada pela:

  • avaliação inicial automática ou reação afetiva;
  • avaliação primária baseada na história pessoal, experiências prévias e aprendizado;
  • avaliação das capacidades e recursos de enfrentamento do estressor;
  • organização da ação ou seleção da resposta ao estressor.11

            A etapa seguinte é um conjunto de mecanismos que compõe o sistema de defesa biológica. Na presença de estímulos ou situações percebidas e interpretadas pelo Sistema Nervoso Central como hostis ou ameaçadoras à vida ou integridade pessoal, o organismo emite um conjunto de respostas organizadas e coordenadas para enfrentar ou fugir do perigo, aumentando assim a probabilidade da sobrevivência do indivíduo.12 A resposta biológica ao estresse consiste de quatro mecanismos de defesa:

  • resposta do comportamento;
  • Sistema Nervoso Autônomo;
  • Sistema Neuroendócrino;
  • resposta imunológica.

            A resposta do comportamento diante de um estressor inclui: o enfrentamento (ataque), a evitação (fuga) e a passividade (colapso). As estratégias de enfrentamento (coping) correspondem a um conjunto de pensamentos, comportamentos e ações que são usados para lidar com os estressores. As estratégias de enfrentamento podem ser aprendidas, usadas, reforçadas e descartadas, de acordo com a experiência do indivíduo.4

            O enfrentamento apresenta duas funções básicas: o foco no problema e o foco na emoção. Quando o indivíduo avalia que o estressor é passível de modificação ou superação, o foco no problema é a intervenção mais adequada. Se houver baixa possibilidade de intervir e controlar o estressor, o foco na emoção é a melhor alternativa. O objetivo da mobilização das estratégias de enfrentamento é melhorar a tolerância, minimizar, aceitar ou ignorar o estressor, sendo um importante mecanismo de adaptação para a resolução de problemas e gerenciamento do estresse centrado no indivíduo.13

            O Sistema Nervoso Autônomo subdivide-se em Sistema Nervoso Simpático (SNS) e Sistema Nervoso Parassimpático. Esses dois sistemas funcionam de forma antagônica, são involuntários e se complementam na busca do estado de equilíbrio interno do organismo. A exposição a um agente estressor gera estímulos provenientes da medula espinhal, tronco cerebral, hipotálamo e algumas áreas do córtex cerebral que promovem a ativação imediata do SNS. Os neurônios pós-ganglionares simpáticos liberam noradrenalina e as fibras nervosas simpáticas estimulam diretamente as células cromafins da medula da suprarrenal que secretam adrenalina (80%) e noradrenalina (20%).

            A ativação do SNS mobiliza a energia necessária para a resposta ao estresse: dilatando as pupilas; aumentando o ritmo respiratório e relaxando os brônquios; acelerando a frequência cardíaca e aumentando a pressão arterial; promovendo a liberação de glicose pelo fígado; produzindo e liberando adrenalina e noradrenalina pela medula das glândulas supra-renais.14,15,16,17

            O Sistema Neuroendócrino consiste, principalmente, da ativação do eixo hipotálamo/hipófise/suprarrenal (HHSR) que funciona como um sistema regulador que integra as funções endócrinas e neurológicas e desempenha um papel central na resposta ao estresse. Os componentes neuroendócrinos ativados pelos estressores incluem a liberação do Hormônio Liberador da Corticotrofina (HLC) e da Arginina Vasopressina (AVP) pelas células neurossecretoras do núcleo paraventricular do hipotálamo na microcirculação porta da hipófise.14

            O HLC é o principal responsável pela estimulação da hipófise para liberação do Hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). A ação do HLC é modulada pelo neuroesteróide tetrahydrodeoxycorticosterona (THDOC) sobre os receptores específicos nos neurônios.18 A vasopressina é menos potente. Age potencializando o efeito do HLC que se une aos receptores específicos na hipófise anterior. O resultado,segundos mais tarde, é a secreção do ACTH que, por sua vez, se liga ao receptores no córtex da suprarrenal, promovendo a produção e secreção do cortisol.14

            O cortisol age promovendo a integridade fisiológica, regulando os níveis de glicose pelos mecanismos de glicogenólise e gliconeogênese, e mantendo o equilíbrio hemodinâmico, essenciais à sobrevivência do indivíduo. O cortisol endógeno promove uma resposta de retroalimentação negativa, interagindo com os receptores de glicocorticóides no eixo HHSR e no hipocampo, inibindo a secreção do ACTH pela hipófise e do HLC a partir do hipotálamo. A produção excessiva e prolongada de cortisol pode lesar as estruturas cerebrais (hipocampo) essenciais para o controle do eixo HHSR e prejudicar o funcionamento celular. Contribui para alterações da memória e da cognição associadas ao estresse crônico.14

            A função do HLC não está restrita ao eixo HHSR. O HLC coordena a resposta ao estresse (neuroendócrina, cardiovascular, autonômica e imunológica) e também funciona como um neurotransmissor ou mediador, integrando os múltiplos sistemas cerebrais. Desempenha assim um papel fundamental na resposta adaptativa e comportamental que ocorre durante períodos de estresse.19

            A resposta imunológica é mediada pelo cortisol. Caracteriza-se pela estabilização das membranas dos lisosomas, diminuição da permeabilidade capilar, da formação de prostaglandinas e da migração dos leucócitos para a área inflamada e inibição da reprodução dos linfócitos. Isto resulta em resposta anti-inflamatória e imunosupressora atribuída aos corticosteróides.

            Podemos sintetizar a resposta ao estresse dividindo-a em duas etapas: a primeira caracteriza-se pela liberação imediata de catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) pelo sistema nervoso simpático e pela secreção de HLC na circulação porta-hipofisária e pela liberação de ACTH na hipófise. Na segunda etapa, um pouco mais tardia, ocorre a secreção dos glicocorticóides (cortisol) pelo córtex da suprarrenal. O resultado desse processo – a resposta ao estresse – inclui um conjunto de adaptações fisiológicas:

  • mobilização da energia para preservar a função cerebral e muscular;

o   liberação de glicose armazenada pelo fígado na corrente sanguínea.

  • atenção concentrada na ameaça percebida;
  • dilatação das pupilas e exoftalmia, para aumentar a acuidade visual;
  • aumento das taxas de perfusão cerebral e de utilização cerebral da glicose;
  • aumento do débito cardíaco e da respiração e redistribuição do fluxo sanguíneo prioritariamente para o cérebro e músculos;

o   aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial;

o   aumento da frequência respiratória e dilatação dos brônquios;

o   diminuição do fluxo sanguíneo para a pele e vísceras;

o   contração do baço, redistribuição do fluxo para áreas prioritárias (cérebro e músculos);

  • modulação da função imunológica;
  • inibição da função reprodutiva e do comportamento sexual;
  • redução da ingestão de alimentos e do apetite.14,15,16,17

REFERÊNCIAS:

1. SELYE, H. Forty years of stress research: principal remaining problems and misconceptions. Canadian Medical Association Journal, Ottawa, v.115, p.53-56, 1976.

2. SELYE, H. The stress of life. New York: McGraw-HillBook Company, 1956. 324p.

3. KALIMO, R. Stress in work: conceptual analysis and a study on prison personnel. Scandinavian Journal of Work, Environment and Health, Helsinki, v.6, n.3, p.1-148, 1980.

4. LAZARUS, R.; FOLKMAN, S. Stress, appraisal and coping. New York: Springer, 1984.

5. ROCHA, L.E.; GLIMA, D.M.R. Distúrbios psíquicos relacionados ao trabalho. In: FERREIRA JUNIOR, M. Saúde no trabalho: temas básicos para o profissional que cuida da saúde dos trabalhadores. São Paulo, Roca, 2000. cap. 12, p.320-351.

6. VAN DE KAR, L.D.; BLAIR, M.L. Forebrain pathways mediating stress induced hormone secretion. Front. Journal of Neuroendocrinology, [s.l], n.20, p. 1 – 48, 1999.

7. HOLMES, T.H; RAHE, R.H. The social readjustment rating scale. Journal of Psychomatic Research, Australia, n.11, p. 213-17, 1967.

8. BROWN, G.W.; HARRIS, T.O. (eds). Social origins of depression: a study of psychiatric disorder in women. London: Tavistock, 1978.

9. SILBERG, J. et al. Genetic moderation of environmental risk for depression and anxiety in adolescent girls. British Journal of Psychiatry, London, n.179; p.116-121, 2001.

10. MARGIS, R. et al. Relação entre estressores, estresse e ansiedade. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul,  Porto Alegre,  v. 25,  p. 65-74, 2003. 

11. LABRADOR, F.J.; CRESPO, M. Evaluación del estrés. In: FERNÁNDEZ-BALLESTEROS, R. Evaluación conductual hoy. um enfoque para el cambio em psicologia clínica y de la salud. Madrid: Ediciones pirámide, 1994. p. 484-529.

12. MOBERG, G.P. Biological response to stress: implications for animal welfare. In: MOBERG, G.P.; MENCH,J.A. (eds). The biology of animal stress: basic principles and implications for animal welfare. S.l: CABI Publishing, 2000. 392p.

13. LAZARUS, R.S. Stress and emotion. New York: Springer, 1999.

14. CARRASCO, G.A.; VAN DE KAR, L.D. Neuroendocrine pharmacology of stress. European Journal of Phamarcology, Florida v. 1-3, p.235-72. 2003.

15. HABIB, K.E.; GOLD, P.W.; CHROUSOS, G.P. Neuroendocrinology of stress. Endocrinology and Metabolism Clininics of North America, Philadelphia, n. 30, p. 695– 728, 2001.

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18. SARKAR J., WAKEFIELD S., MACKENZIE G., MOSS S. J., MAGUIRE J. (2011). Neurosteroidogenesis is required for the physiological response to stress: role of neurosteroid-sensitive GABAA receptors. J. Neurosci. 31, 18198–18210. doi: 10.1523/JNEUROSCI.2560-11.2011.

19. NEMEROFF, C.B. The corticotropin-releasing factor (CRF) hypothesis of depression: new findings and new directions. Molecular Psychiatry, [s.l], v.4, n.1, p.336-42, 1996.